30 janeiro 2015

Ele disse bom-dia

Frequento, há algum tempo, uma academia de ginástica  do meu bairro. As pessoas que lá trabalham são extremamente competentes e simpáticas. Nesta semana, quando cheguei, bem cedo, os funcionários da portaria diziam: “Ele disse bom-dia". E repetiam quase que atônitos: "Ele disse bom-dia". Entrei na sala de musculação, e os comentários de alguns professores iam na mesma direção: "Que estranho. Ele disse bom-dia". Gosto da prosa, mas não dedico muito tempo a investigar vidas alheias; entretanto, curioso, quis saber. Contaram-me que um homem, que nunca cumprimentava ninguém, entrou na academia dizendo bom-dia. Apenas uma vez. Mas pegou todos de surpresa. Uma funcionária havia dito que, no início, todos diziam bom-dia a ele. Depois, acharam deselegante incomodá-lo, já que ele não respondia. E, naquele dia, ele, enfim, dissera bom-dia.
Parece estranho um simples dizer causar tanto movimento nos movimentos cotidianos. A ausência de polidez é um desperdício na arte do convívio. As pessoas não fazem parte da paisagem. Elas existem. Gostam de ser acolhidas. O que leva alguém a não retribuir um simples "bom-dia"? Superioridade? Timidez? Contenção de sentimentos?
Ao sair da academia, parei para conversar com os atendentes. Todos muito simpáticos, como já disse. Foi justamente quando o homem estava indo embora. Um atendente lhe disse, “Tenha um bom-dia". Ele não respondeu. Não olhou para trás. E saiu decidido a viver sem essas interferências desnecessárias. Um olhou para o outro e tentaram entender o que acontecera. "Será que ele não disse e nós pensamos ouvir? Será que ele ganhou na Mega-Sena e resolveu, então, dar bom-dia? Mas foi apenas um! Não, o ganhador da Mega- Sena desta semana é de Sorocaba. Certamente, essa não foi a razão". Estranhos comportamentos de quem convive com pessoas. Gestos de gentileza, mesmos os mais singelos, têm muito poder. O poder de nos sabermos frutos da mesma espécie. Da que precisa de afeto.
Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 30/01/2015

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